quinta-feira, 10 de junho de 2010

Pensão vitalícia pedida por companheira - período de união estável menor que cinco anos - cabimento de liminar para analisar conflito entre leis

Supremo Tribunal Federal
MS 28.026
Origem: DF - DISTRITO FEDERAL
Relator: MIN. GILMAR MENDES
IMPTE.(S) MYLENE MONTEIRO RODER
ADV.(A/S) MÁRCIO POLLET E OUTRO(A/S)
IMPDO.(A/S) PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
DECISÃO:
Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida liminar, impetrado por Mylene Monteiro Roder contra ato do Presidente da Câmara dos Deputados, consubstanciado no indeferimento do pedido de pensão por ela formulado, em virtude do falecimento do ex-parlamentar Flavio Augusto Coelho Derzi.
A autoridade apontada como coatora negou o benefício ao fundamento de que a concessão de pensão vitalícia - integral e com direito a atrasados -, no quadro fático que se apresenta, contrariaria o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, especilamente porque a união entre a requerente e o ex-Deputado Federal teria durado apenas 7 (sete) meses (fls. 405 e 409).
Sustenta que a impetrante não teria completado os cinco anos de união estável exigidos pelo artigo 28, inciso I, da Lei n.º 7.087/82. Tal dispositivo seria aplicável ao caso concreto, ante a omissão da Lei 9.506/97 em indicar os dependentes que fazem jus ao recebimento de pensão parlamentar.
Afirma, ainda, que a decisão que declarou a união estável faria coisa julgada apenas entre as partes, a teor do artigo 472 do Código de Processo Civil. Assim, no seu entender, o decisum não é oponível à Câmara dos Deputados.
Ademais, assevera que, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, na hipótese de ausência de beneficiário formalmente habilitado para a pensão, competiria à Justiça Federal o reconhecimento da união estável, quando a finalidade precípua fosse a obtenção de benefício previdenciário em face da União.
Por sua vez, a requerente alega, em síntese, que faria jus ao recebimento da pensão, haja vista ter convivido em união estável com o ex-Deputado Federal, situação jurídica reconhecida, com trânsito em julgado, nos autos do processo n.º 001.05.0313530-4, que tramitou perante a 3ª Vara de Família da Comarca de Campo Grande-MS.
Ressalta, ainda, que o artigo 226, § 3º, da Constituição vedaria a existência de qualquer distinção entre cônjuge e companheira. Por conseguinte, seria inaplicável, à espécie, o disposto no o artigo 28, inciso I, da Lei n.º 7.087/82, pois, no seu entender, a matéria seria hoje disciplinada exclusivamente pelo artigo 3º da Lei n.º 9.506/1997.
Afirma, também, a competência da Justiça Estadual para o reconhecimento da união estável. Salienta que a autoridade impetrada não teria pleiteado o seu ingresso no feito, a despeito de ter sido cientificada do seu trâmite.
Requer, então, liminarmente, sua imediata inclusão na folha de pagamentos da Câmara dos Deputados e, ao final, que seja reconhecido, de forma definitiva, seu direito a perceber pensão parlamentar, desde o falecimento do ex-Deputado Federal Flávio Augusto Coelho Derzi.
Observo que o mandamus foi inicialmente impetrado perante a 21ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, que, contudo, declinou da competência a esta Suprema Corte, com fundamento no artigo 102, I, “d”, da Constituição, tendo em vista que a autoridade impetrada atuou em nome da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados (fls. 432-434).
O Ministro Cesar Peluso, então relator, solicitou informações à autoridade impetrada (fl. 400), as quais foram prestadas às fls. 445-491.
Decido.
Em um juízo sumário, próprio das medidas liminares, entendo que não restaram caracterizados os requisitos necessários à concessão da tutela de urgência. A questão é complexa e envolve conflito aparente entre a Lei n.º 7.087/82 e a Lei n.º 9.506/97, cuja análise é incompatível com a avaliação perfunctória característica desta fase processual.
Consigno de imediato que, à luz da Constituição, não se justifica qualquer tratamento discriminatório entre a união estável e o casamento, conforme sustentado pela impetrante. Entretanto, o argumento, per se, não justifica a concessão do pagamento do benefício, ao menos em sede de medida liminar.
A controvérsia demanda a análise prévia de outras questões, como a possibilidade de a norma condicionar a concessão do benefício a um interregno mínimo de convivência – quer configurado o casamento ou a união estável. Além disso, a celeuma passa, também, pelo questionamento da razoabilidade de o erário arcar com o pagamento de um benefício integral, em vista do exíguo tempo de contribuição do parlamentar.
Assim, nesta análise preliminar, seria prematuro se debruçar sobre o tema - inusitado e de alta complexidade.
Por fim, no caso concreto, não se identifica o periculum in mora indispensável à concessão da medida liminar. É relevante a informação da autoridade impetrada no sentido de que a pensão foi requerida quase quatro anos após o falecimento de Flávio Augusto Coelho Derzi (fls. 447). Nesse contexto, em que pese ao caráter alimentar do benefício pleiteado, a inicial do writ não logrou demonstrar que a impetrante dependia economicamente do ex-parlamentar a ponto de o tempo necessário ao julgamento do mandamus comprometer sua subsistência.
Ante o exposto, indefiro a medida liminar.
Encaminhem-se os autos à Procuradoria-Geral da República.
Publique-se.
Brasília, 1º de junho de 2010.


Ministro GILMAR MENDES
Relator

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